Powered By Blogger

segunda-feira, 10 de maio de 2010

*AFORAMENTO DE TERRENOS DA MARINHA


A partir da colonização do Brasil pelo então reino de Portugal, o domínio da terra brasileira foi sendo transferido para particulares (cartas de 'sesmarias'), prosseguindo mesmo após a independência do Brasil (1822), com a venda, doação ou concessão de usucapião aos súditos e imigrantes (1867).

A par disso, a Coroa manteve, expressamente, o domínio público sobre determinadas áreas, incluindo os denominados 'terrenos de marinha', reservados, de regra, para fins militares (proteção do Estado).

Com a proclamação da República, a União Federal 'sucedeu' os bens da Coroa, detendo a presunção 'juris tantum' de propriedade de qualquer solo no Brasil. Assim, cabe ao cidadão demonstrar a propriedade da terra, através de justo título que demonstre, em cadeia sucessória, sua transferência pelo Poder Público.

Atualmente, a União Federal justifica a propriedade dos terrenos de marinha para a ordenação da zona costeira, proteção ambiental, atividades policial/militares e urbanísticas.

A destinação dos terrenos de marinha à União Federal está prevista no artigo 20 da Constituição da República. A regulamentação deste dispositivo é feita por legislação ordinária: Decretos-Leis 5.666/43 e 9.760/46, e Lei 9.636/98 (alterada pela Lei 9.821/99).

Terrenos de marinha, segundo a Lei, são aqueles localizados na costa marítima e nas margens de rios, lagoas e ilhas (até onde se sinta a influência das marés), a uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, contados a partir da posição da Linha do Preamar-Médio de 1831.

A linha do preamar-médio varia anualmente, o que impossibilitaria toma-la como ponto de referência para a delimitação dos terrenos de marinha. Assim, o Imperador determinou que se estabelecesse a linha do preamar-médio para o ano de 1831, preservando-a para o futuro, garantindo, assim, o direito adquirido dos proprietários, pois tornava inalterada a situação jurídica. Esta determinação vigora até hoje.

Apesar da propriedade do terreno de marinha ser, exclusivamente, da União Federal, esta pode transferir para terceiros, onerosa ou gratuitamente, o seu 'domínio útil', através de contrato escrito. Este contrato chama-se 'aforamento' (ou 'enfiteuse'). Na verdade, é muito mais um processo administrativo do que um contrato, pois este é firmado, apenas, se satisfeitos os requisitos legais para sua concessão, apuráveis pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Chama-se 'aforamento' pois impõe ao beneficiário a obrigação de pagar um valor anual em dinheiro, denominado 'foro'.

O valor do 'foro' corresponde a 0,6 (zero virgula seis por cento) do valor atualizado do domínio pleno terreno, que é o valor de mercado do imóvel. Explica-se: a lei atribui valores diferenciados ao terreno de marinha, para diferentes efeitos legais. Assim, diz-se que o 'domínio pleno' constitui o direito integral sobre o imóvel, e seu valor é o valor de mercado do terreno. Já 'domínio útil' é o direito de posse, uso e gozo do imóvel (permite inclusive a transmissão por sucessão ou alienação), e o seu valor corresponde a 83% (oitenta e três por cento) do valor do domínio pleno (valor de mercado).

Os valores cobrados pela utilização destes imóveis formam as chamadas 'receitas patrimoniais da União', que devem ser dispostas no orçamento anual da União Federal.

A Lei 9.636 foi regulamentada no início deste ano (2001), e deixa claro a intenção do Governo Federal em transferir o domínio útil dos terrenos de marinha aos particulares, através de leilão. Quem estiver regular com o Patrimônio da União (inscrito na Secretaria de Patrimônio da União como foreiro, tendo pago o laudêmio e as demais taxas), não terá problemas. Entretanto, quem utiliza um terreno de marinha como ocupante, terá, obrigatoriamente, de obter o aforamento, ou, ao menos, a cessão onerosa do uso do imóvel. Quem mora em imóvel de incorporação não deverá ter problemas, pois é exigido, no registro da incorporação, a autorização da SPU. Quem estiver ocupando o terreno de marinha irregularmente (sem licença da SPU), deve regularizar a situação, a fim de obter os direitos supra descritos (cessão onerosa de uso ou o aforamento).

Com esta providência, o Governo Federal pretende arrecadar, aproximadamente, 130 bilhões de reais, sendo que parte desta quantia será destinada ao pagamento da dívida externa. Esta iniciativa é contestada, tendo em vista a existência de inúmeros ocupantes históricos de terrenos de marinha, que utilizam o imóvel como "posse" (sem registro, como colônias de pescadores), e, ao menos em tese, não terão direito ao aforamento gratuito (terão de pagar o domínio útil do imóvel, mesmo que tenham adquirido o terreno de particulares).

Há que se reconhecer, também, uma grave injustiça social: a avaliação do terreno de marinha (fase anterior à venda por leilão) levará em conta o preço de mercado do imóvel. Assim, a União Federal, que não investiu sequer um centavo na infra-estrutura do litoral brasileiro, se beneficiará das melhorias feitas pelas Prefeituras e pelos Estados (estradas, rede elétrica, loteamentos, água e esgoto).

Existem duas formas de obter o aforamento: uma gratuita, outra onerosa.

AFORAMENTO ONEROSO

O aforamento oneroso dá-se por leilão ou concorrência pública. Neste caso, a União Federal, através da SPU, publica edital de transferência do domínio útil de determinada área, cabendo aos interessados (que preencherem os requisitos) comparecerem ao local indicado e efetuarem suas propostas. Nesta proposta, o interessado dirá o preço que se propõe a pagar pelo domínio útil e as condições do pagamento. O vencedor 'adjudicará' o contrato em seu favor, passando a ter o domínio útil sobre o imóvel.

Na concessão do aforamento, deve ser dada preferência a quem, comprovadamente, estiver na posse do imóvel há mais de um ano, bem como esteja inscrito como 'ocupante' e em dia com suas obrigações na SPU. Para tanto, o posseiro deve pagar o preço oferecido pelo vencedor da licitação, nas mesmas condições, em até 48 (quarenta e oito) horas da data da publicação do resultado.

Segundo a Lei 9.636, os ocupantes registrados até 05.10.88 que não exercerem o direito de preferência terão garantidos os seus direitos ao imóvel mediante a celebração de contrato de cessão de uso onerosa, por prazo indeterminado.

Chama-se 'ocupação' o direito precário do possuidor sobre o imóvel, caracterizado pela existência de benfeitorias que demonstrem seu aproveitamento. A lei admite a transferência, apenas, das benfeitorias, e não do domínio útil. Deve ser pago uma 'taxa de ocupação' anual para regulamentar esta situação (variável de 2% a 5% sobre o valor do domínio pleno do terreno).

Os estrangeiros têm direito ao aforamento. No entanto, para o aforamento de terrenos situados na faixa de 100 (cem) metros ao longo da costa marítima, ou de uma circunferência de 1.320 (mil trezentos e vinte metros) de raio em torno das fortificações militares, deve haver, antes, autorização do Presidente da República, encaminhada pela SPU. No caso de condomínio, se o imóvel for urbano e as frações ideais não ultrapassarem a 1/3 do imóvel, o estrangeiro pode obter o aforamento sem a referida autorização.

AFORAMENTO GRATUITO

Dentro de determinadas circunstâncias, é permitido o aforamento do terreno de marinha sem o pagamento do valor do domínio útil. Neste caso, o adquirente será dispensado de pagar o valor de mercado do terreno à União Federal, porque já o fez ao adquirir de um terceiro, que possuía o aforamento (ou o direito ao aforamento), ou ao suceder nos bens do 'de cujus' (herança).

Possuem direito ao aforamento gratuito aqueles que atenderem a qualquer dos itens previstos no artigo 105 do Decreto-Lei 9.760/46:

I - os que tiverem título de propriedade devidamente transcrito no Registro de Imóveis (até 05.09.1946, diretamente ou por cadeia sucessória);

II - os que estejam na posse dos terrenos, com fundamento em título outorgado pelos Estados ou Municípios;

III - os que, necessariamente, utilizam os terrenos para acesso às suas propriedades;

IV- os ocupantes inscritos até o ano de 1940, e que estejam quites com o pagamento das devidas taxas, quanto aos terrenos de marinha e seus acrescidos;

V - os que, possuindo benfeitorias, estiverem cultivando, por si e regularmente, terras da União, quanto às reservadas para exploração agrícola, na forma do art. 65 (terras reservadas pela União para fins agrícolas);

VI - os concessionários de terrenos de marinha, quanto aos seus acrescidos, desde que estes não possam constituir unidades autônomas;

VII - os que no terreno possuam benfeitorias, anteriores ao ano de 1940, de valor apreciável em relação ao daquele;

VIII - os concessionários de serviços públicos, quanto aos terrenos julgados necessários a esses serviços, a critério do Governo;

IX - os pescadores ou colônias de pescadores, que se obrigarem a manter estabelecimento de pesca ou indústria correlata, quanto aos terrenos julgados apropriados;

X - os ocupantes de que trata o art. 133 (fins agrícolas ou pastoris), quanto às terras devolutas situadas nos Territórios Federais.

O art. 215 do mesmo Decreto-Lei prevê o revigoramento de alguns direitos peremptos, que serão apurados, conforme o caso, após notificação a ser feita pela SPU.

O caso mais comum é a utilização de um terreno de marinha, ou a aquisição de um, desconhecendo esta característica. Portanto, é sempre recomendável consultar a SPU quando da aquisição de um terreno situado próximo ao mar, rios e lagoas.

Caso o proprietário verifique que o terreno, de fato, está cadastrado na SPU como terreno de marinha, deve dar início ao procedimento de regularização da situação. Neste caso, se o terreno possuir registro anterior a 05.09.1946, e tiver sido adquirido por sucessão (herança) ou compra e venda (casos mais comuns), basta comparecer à SPU, portando a documentação adequada, e requerer o aforamento gratuito. (Obs.: para os terrenos registrados após aquela data, o interessado, via de regra, deverá pagar o domínio útil à União Federal para regularizar a situação, o que implicará em pagar duas vezes pelo imóvel, sem prejuízo de ação indenizatória contra o vendedor que omitiu a irregularidade. Mas vale consultar a SPU, pois existem outros casos de aforamento gratuito).

Para pessoas físicas, é necessário anexar ao requerimento cópias da identidade, CPF, Título de Eleitor e Certificado de Reservista. Se for casado, deve levar cópia da Certidão de Casamento. Se for separado judicialmente, deve constar a averbação desta decisão na Certidão. Se for viúvo, a certidão de óbito do cônjuge.

Se o requerente for pessoa jurídica, deve anexar ao requerimento cópias do CGC, contrato social, estatutos, ata de constituição, ata da assembléia que elegeu a diretoria atual (tudo com registro na Junta Comercial), comprovante de atendimento da Lei 4.440/64 (Salário Educação), RAIS e CND com IAPAS.

Caso o interessado opte pela interveniência de um advogado (sempre recomendável), deve anexar procuração outorgando poderes especiais com firma reconhecida.

Além destes documentos, deve o interessado anexar ao requerimento:

a) título de propriedade do imóvel com cadeia sucessória até a origem (para demonstrar que o registro imobiliário deu-se anteriormente à 05/09/46), inclusive quanto a averbação do inventário (se for o caso);

b) escritura pública de transferência de ocupação de terreno de marinha e de suas benfeitorias, firmada pelo vendedor e comprador em cartório de registro de notas (no caso de compra e venda - este documento deve ser feito quando da realização do contrato de compra e venda, pois o oficial de registro de imóveis não fará a transferência sem que haja a autorização e/ou aforamento dado pela SPU);

c) planta de localização e situação do imóvel, vinculada a ponto de referência física notório na região e/ou a acidentes geográficos, constando as dimensões e confrontações, com indicação do norte magnético e localização das benfeitorias, se existentes, em escala de 1:200 e 1:1000, e em 5 vias (podem ser separadas, mas devem constar todos os dados referentes);

d) planta baixa das construções do terreno, se existentes, constando a área total e idade provável (escala 1:50 e 1:200);

e) memorial descritivo das benfeitorias, constando a área útil das dependências, área total da construção e idade provável;

f) quatro fotografias a cores, 9 x 12, de cada benfeitoria, tomadas na diagonal das mesmas, em posição que se cruzem (1 jogo);

g) três fotografias a cores, 9 x 12, de cada construção tiradas do logradouro de acesso, tomadas uma de frente e uma de cada lado a 45º (1 jogo);

h) IPTU ou declaração da Prefeitura Municipal declarando que o imóvel não se encontra cadastrado.

Existem outros casos de aforamento gratuito em que são dispensados alguns destes documentos e/ou exigidos outros, como no caso do terreno que for abrangido em descrição feita por ocasião de outro aforado vizinho ou próximo; terreno em loteamento aprovado pela Prefeitura ou terreno com ocupação inscrita na SPU.

A venda dos direitos incidentes sobre o terreno de marinha, pelo foreiro, ocupante ou cessionário, é permitida, mas condicionada ao pagamento do 'laudêmio', que nada mais é do que uma taxa devida à União Federal pelo alienante, quando da transferência, equivalente a 5% do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias do imóvel.

Fonte : Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo.

Um comentário:

  1. O problema é saber o que pode ser considerado terras de marinha passíveis de ocupação. Aqui no Rio Grande do Norte, imensas áreas de praias, consideradas como servidões públicas( área de passseio ao longo da faixa de praia na preamar) estão ocupadas e cadastradas da SPU local.Aqui não cumprem com a Legislação Patrimônial que uma das prerrogativas é a conservação e fiscalização da áreas de uso comum do povo assegurada pela Lei 7661/88.

    ResponderExcluir