A Ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu decisões que determinaram o imediato cancelamento de inúmeras matrículas imobiliárias sem manifestação prévia dos interessados. Os atos contestados são da Corregedoria Nacional do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJ-PA), que estipularam o prazo de 30 dias para o cumprimento da decisão.
A relatora deferiu parcialmente os pedidos de medida liminar em dois Mandados de Segurança para suspender, apenas e tão-somente quanto à Arca Indústria e Agropecuária Ltda. (MS 30220) e aos atuais associados à Associação da Cadeia Produtiva Florestal da Amazônia – Unifloresta (MS 30231), os efeitos da decisão proferida em 16 de agosto de 2010 pela Corregedoria Nacional de Justiça. A suspensão vale até o julgamento do mérito desses mandados de segurança. Entretanto, permanecem sujeitos à averbação do bloqueio das referidas matrículas.
O CASO
O Estado do Pará, o Instituto de Terras do Pará (Iterpa), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual, a Advocacia Geral da União e outras entidades da sociedade civil organizada protocolaram pedido de providências pleiteando que o CNJ determinasse ao TJ-PA a baixa de atos normativos necessários ao cancelamento administrativo das matrículas irregulares, “tidas como nulas de pleno direito nos cartórios de registro de imóveis nas comarcas do interior”.
Conforme os processos, a decisão do conselho foi tomada sem qualquer participação direta ou indireta de quaisquer interessados proprietários dos imóveis que tiveram suas respectivas matrículas canceladas. Assim, tanto a decisão da Corregedoria Nacional [que ordenou o cancelamento] quanto da Corregedoria de Justiça do estado [que executou a ordem] teriam violado o princípio da legalidade e a Constituição Federal.
SITUAÇÃO CAÓTICA
Inicialmente, a ministra salientou a situação caótica dos registros de terras no Estado do Pará, “que chegou ao ponto de ter municípios em que os registros e matrículas imobiliários apontam áreas territoriais maiores do que o próprio estado, situação teratológica que certamente conduziu a Corregedoria Nacional de Justiça a tomar a decisão ora impugnada, para tentar colocar ordem na atividade registral daquela unidade federativa”.
Assim, Ellen Gracie constatou haver necessidade de “máxima prudência no presente caso”. Isto porque, conforme ela, “o simples deferimento do pedido de medida liminar poderá conduzir a situações temerárias, que a Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado do Pará buscou evitar, ao editar o Provimento 013/2006-CJCI, bloqueando matrículas de áreas rurais”.
PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO
Neste primeiro momento, a relatora considerou que há plausibilidade jurídica do pedido formulado nos mandados de segurança. Ela ressaltou que o Pedido de Providências no CNJ tramitou em segredo de justiça e, por esse motivo, as autoras e os associados não tiveram acesso regular ao processo.
“É dizer, não foram eles previamente intimados para se defender perante a Corregedoria Nacional de Justiça, o que ofende, a princípio, os mandamentos insertos no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal”, entendeu. Nesse sentido, a ministra lembrou precedente (MS 27154) julgado recentemente pelo Plenário do STF.
De acordo com a ministra Ellen Gracie, o próprio artigo 214, da Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), utilizado como razão de decidir pelo então corregedor Nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, “explicita, em seu parágrafo primeiro, que a nulidade será decretada depois de ouvidos os atingidos".
A relatora também salientou a densidade jurídica dos argumentos apresentados na decisão da Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, ao indeferir o pedido de cancelamento administrativo das matrículas dos imóveis rurais bloqueadas por força do Provimento 013/2006-CJCI. Aquela Corregedoria entendeu que o cancelamento do registro por nulidade em si mesmo poderia ser realizado na via administrativa, mas a declaração de nulidade de um título que serviu como base para o registro, entretanto, necessitaria de decisão judicial transitada em julgado.
Ao final de sua decisão, a ministra Ellen Gracie também verificou a existência do perigo na demora, consubstanciado no fato de que a decisão questionada causa sérios prejuízos às autoras e associados, tendo em vista o cancelamento dos registros de suas propriedades.
Fonte : Supremo Tribunal Federal.
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